terça-feira, 24 de janeiro de 2012

O SINDICALISMO E A DITADURA

Esse documentário conta como operários e líderes sindicais da região do ABC Paulista resistiam à falta de liberdade e se organizavam por melhores salários e condições de vida. O programa mostra a trajetória dos metalúrgicos: da alienação política à campanha pelas eleições diretas em 1984 e como a batalha por melhores salários resultou na luta pela redemocratização do Brasil. Histórias dramáticas e curiosas de operários anônimos e líderes reconhecidos.

CRIOLO - Versão Cálice - Chico Buarque (DIGA NÃO AO PRECONCEITO E A VIOLÊNCIA))



CRIOLO - Versão Cálice (Chico Buarque)

Como ir pro trabalho sem levar um tiro
Voltar pra casa sem levar um tiro
Se as três da matina tem alguém que frita
E é capaz de tudo pra manter sua brisa

Os saraus tiveram que invadir os botecos
Pois biblioteca não era lugar de poesia
Biblioteca tinha que ter silêncio,
E uma gente que se acha assim muito sabida

Há preconceito com o nordestino
Há preconceito com o homem negro
Há preconceito com o analfabeto
Mais não há preconceito se um dos três for rico, pai.

A ditadura segue meu amigo Milton
A repressão segue meu amigo Chico
Me chamam Criolo e o meu berço é o rap
Mas não existe fronteira pra minha poesia, pai.

Afasta de mim a biqueira, pai
Afasta de mim as biate, pai
Afasta de mim a coqueine, pai
Pois na quebrada escorre sangue,pai.
Pai
Afasta de mim a biqueira, pai
Afasta de mim as biate, pai
Afasta de mim a coqueine, pai.
Pois na quebrada escorre sangue.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

E AGORA LUZINETE? Gerações de mulheres entregues a própria sorte. (da série: Mulheres presas)

Copiado do Blog http://sedicoes.wordpress.com/


Luzinete Oliveira Sodré é a intermediária de gerações femininas abandonadas a própria sorte. Luzinete é mãe e filha.

Antes, Luzinete trabalhava fora de casa para garantir o sustento da família, enquanto a mãe tomava conta da neta. Mas, quando a mãe adoeceu e não teve condições de cumprir com os cuidados exigidos por uma criança de 6 anos, além, de ela mesma depender de cuidados, Luzinete em princípio titubeou, mas não teve outra saída.

Saiu do emprego fixo. Embora fosse apenas um salário mínimo, tinha carteira assinada, previdência e plano de saúde. Mas nada disso podia ajudá-la a zelar da mãe e filha que ficariam sem assistência alguma sem seus cuidados.

O único sustento passou a ser a aposentadoria da mãe, mas que cobria a necessidades essenciais. Bem ou mal, o benefício auferido pela mãe passou a sustentar as três gerações de mulheres, esquecidas de todos.

Acontece que a mãe de Luzinete faleceu e com ela a aposentadoria. E agora Luzinete?

E agora Luzinete?

Fonte: Jornal O Hoje http://www.facebook.com/l.php?u=http%3A%2F%2Fbit.ly%2FrvKlF2&h=_AQF4ewjDAQHj6G2mXB9pO55tWAeHCFrQ4k9NrTeHGWw5xw

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

AS PROSTITUTAS MERECEM RESPEITO E UMA VIDA DIGNA

A CORRESPONDÊNCIA - André Comte - Sponville



A Correspondência

André Comte-Sponville
Texto escrito para o catálogo oficial da exposição “Plis d’excellence”,
Museu do Correio, Paris, 1994

Por que se escreve uma carta? Porque não se pode falar nem calar. A correspondência nasce dessa dupla impossibilidade, que ela supera e da qual se nutre. Entre fala e silêncio. Entre comunicação e solidão. É como que uma literatura íntima, privada, secreta — e talvez o segredo da literatura.

As pessoas se escrevem porque não podem se falar: o mais das vezes por causa da distância, da separação, de um espaço que as falas não podem transpor. Como por ocasião de uma viagem ou de um exílio. Esse foi durante séculos o único meio de dirigir-se aos ausentes, de levar o pensamento aonde o corpo não podia ir, aonde a voz não podia ir, e talvez esse seja o mais belo presente que a escrita deu aos viventes: permitir-lhes vencer o espaço, vencer a separação, sair da prisão do corpo, ao menos um pouco, ao menos pela linguagem, por esses pequenos traços de tinta sobre o papel. O mais belo presente, mas não o único, nem o primeiro. A escrita teve uma função de arquivamento, sem dúvida, antes de ter uma de comunicação. Tratava-se de vencer o tempo, mais do que o espaço. De conservar, mais do que trocar. Ou, se a escrita servia para comunicar-se, era antes pelo deslocamento dos leitores do que pela mensagem. Gravava-se numa estela, na parede, diante das quais as pessoas passavam: imobilidade do texto, mobilidade dos leitores. Uma pirâmide é um envelope, se quiserem, cuja múmia seria a carta, cujos hieróglifos seriam o texto. Alguma coisa se diz aí, comunica-se aí. Uma mensagem, mas sem outro mensageiro além de si. Mas imóvel. Mas que antes percorre os séculos do que quilômetros. Tratava-se de vencer não a ausência mas a morte, não a separação mas o esquecimento, não a distância mas o tempo. Não de trocar, mas de manter. Como são frágeis os nossos envelopes, ao lado dessas tumbas! Eles se parecem conosco. Fragilidade da vida, das trocas, dos indivíduos, sem outra eternidade senão a do tempo que passa, deste presente que perdura, desses viventes que morrem… Fragilidade da correspondência, fragilidade de viver e amar. Escrevemos nossas cartas, não para vencer a morte, não para vencer o tempo, mas para habitarmos juntos, tanto quanto pudermos, apesar da separação, apesar do espaço, o pouco tempo que nos é dado em comum. Salvo megalomania particular, correspondemo-nos apenas com nossos contemporâneos (quando as estelas se dirigiam, antes, aos descendentes), e há nisso, parece-me, algo de essencial à correspondência, que faz sua pobreza e seu valor. Um vivente dirige-se a outro vivente, e não para os séculos dos séculos (como certos escritores, nem sempre os melhores, em seus livros), mas para compartilhar alguma coisa, um acontecimento, ou um pensamento, uma emoção ou um sorriso, muitas vezes quase nada e esse é o essencial de nossas vidas, para compartilhar essa pobreza que somos, que vivemos, que nos faz e desfaz, antes que a morte nos pegue, para não renunciar, enquanto respiramos e sejam quais forem os quilômetros que nos separam, à doçura de viver juntos, em todo caso ao mesmo tempo, à doçura de compartilhar e de amar. Contemporâneos da mesma eternidade, que é hoje. Passantes da mesma passagem, que é o mundo. Turguiéniev, em seu leito de morte, quis escrever uma derradeira carta a Tolstói: “Senhor, foi uma grande felicidade ter sido seu contemporâneo”. Nem todos somos Tolstói, nem tampouco Turguiéniev. Contudo, é um pouco isso que quereríamos dizer, em nossas cartas, pelo simples fato de escrevê-las, e embora na verdade não digamos. Se deixamos de lado as trocas puramente profissionais ou administrativas, quase sempre é de amor que se escreve, e por amor, seja amor de paixão ou de amizade, de família ou de férias, profundo ou superficial, leviano ou sério. Escrevo-te para dizer-te que te amo, ou que penso em ti, que me alegro, sim, de ser teu contemporâneo, de habitar o mesmo mundo, o mesmo tempo, de só estar separado de ti pelo espaço, não pelo coração, não pelo pensamento, não pela morte. Partir é morrer um pouco. Escrever é viver mais.

Nos nossos dias, por certo, o telefone poderia superar o obstáculo da distância, o supera de fato, transmitindo a fala através dos países ou dos continentes. Continuamos, porém, a escrever-nos, e não somente por economia. Várias pessoas mesmo, e sou uma delas, preferem antes receber uma carta a um telefonema. Por que razão? Porque o telefone é inoportuno, indiscreto, tagarela. Também, sobretudo porque há certas coisas que não podem ser ditas, ou que não se ousa, ou que não se sabe. Esse impossível que trazemos em nós. Esse impossível que somos nós. Há cartas que substituem a fala, como um ersatz, um substituto. Depois aquelas que ultrapassam, que com isso tocam no silêncio. Estas nada substituem, e são insubstituíveis. O que não se pode falar, há que escrevê-lo.

Lembro-me, adolescente, de ter trocado cartas com certa garota de quem estava perto todos os dias no liceu, com quem falava, e entretanto, as cartas formavam entre nós um laço mais essencial, mais profundo, mais íntimo. Às vezes elas passavam pelo correio, às vezes de mão para mão e isso nunca nos pareceu extravagante nem absurdo. Por que escrever quando se pode falar-se, quando se fala efetivamente? Porque nem sempre se pode falar, nem de tudo, porque a fala pode criar obstáculo para a comunicação, por vezes, ou condená-la à tagarelice, porque é preciso ter tempo de ficar sozinho, porque é doce pensar no outro em sua ausência, ainda que se deva vê-lo no dia seguinte, dizer-lhe o lugar que ocupa em nossa vida, mesmo quando ele não está presente, em nosso coração, em nossa solidão, e é isso que a fala jamais poderá fazer, uma vez que ela a suprime. A fala não nos aproxima de outrem, com muita freqüência, senão nos separando do outro apenas ficticiamente, apenas em superfície ou pela vitrina. Numa carta, ao contrário, só atingimos o outro ficando o mais próximo de nós. Mas atingimos, pelo menos isso acontece, e numa profundidade que as falas alcançam raramente. A escrita é mais próxima do silêncio, mais próxima da verdade. Ao menos pode sê-lo, e é isso que a justifica. Que adianta escrever, se é para fingir?

Seria preferível o silêncio efetivo? Nem sempre, nem um silêncio qualquer. Escreve-se porque não se pode calar-se ou porque não se quer. O silêncio também é um inimigo, também uma prisão, quando fecha, quando esmaga, quando mata, e às vezes mata. Escreve-se para devolver-lhe sua leveza, sua transparência, sua abertura, sua luz, mas sem o quebrar realmente, como faria a fala, sem sair dele, sem o renegar. Escreve-se no âmago do silêncio, aonde a fala quase não vai. Escreve-se onde se vive, onde se está, o mais próximo de si e do outro. É que já não se está separado pela voz, pelo olhar, pelo corpo (que sempre separa, enquanto os corpos não se tocam). É que também se tem tempo, pelo menos quando se escolhe a ocasião, como o outro terá o de ler você, de lhe reler, e quiçá anos mais tarde. Há uma eternidade das estelas ou das tumbas. É a eternidade de viver, mas sem véus, mas preservada, como uma garrafa lançada no oceano do tempo, como um pedaço do presente no infinito do futuro. As cartas de amor durarão mais tempo, muito amiúde, do que o amor. Elas sobreviverão a ele. Estarão ainda aqui, se se quiser, quando o amor estiver morto: atestarão o que tiver acontecido, o que eternamente continuará verdadeiro, mas que talvez, sem a escrita, teríamos esquecido ou perdido. Toda fala é contemporânea de quem a escuta, e morre com ele. Nenhuma escrita o é de sua leitura, sendo por isso que não morre. Entre o tempo da escrita e o da leitura, há como que uma distância assumida e abolida. Toda fala é do instante; toda escrita, da duração. É essa duração que o leitor descobre, redescobre, habita. Isso faz como que um tempo redescoberto, no vácuo do cotidiano, um pouco de tempo no estado puro, como diria Proust, e é isso a que chamam a eternidade: o tempo passa sem se perder, o presente que muda e continua, o devir permanece…

É onde reencontramos a literatura, ou melhor, não a deixamos pois que é aí que ela começa. Como uma fala eterna. Como um presente salvaguardado. Como uma duração liberta de si, e de tudo. Escrever é sempre escrever para alguém, ou por alguém, seja ele desconhecido, seja ele universal, e toda literatura, nesse sentido, é epistolar. A recíproca é verdadeira também. Uma carta, mesmo canhestra, é uma obra, uma criação, um trabalho, o que a fala quase nunca o é. Toda carta é literária. Um vivente se dirige a um vivente, no segredo de viver. Uma solidão confidencia a outra, no mistério de ser a si, no desconhecido de amar ou de ser dois. Um indivíduo aí se entrega, como pode, como quer. Com suas palavras, sua pobre escrita, sua pobre vida. Essa pobreza se parece conosco. A carta mais canhestra é mais comovente, se é verdadeira, do que um romance hábil, se ele não o é. É uma garrafa no mar, mas cujo destinatário se conheceria. Um presente que se dá, mas que nada tem a oferecer senão a si.

Porque uma carta é uma obra, seja ela qual for, é tentador fazer dela uma obra de arte, que valeria por si mesma. Nem todos são poetas, romancistas, artistas. Mas todos escrevem cartas, pelo menos todos aqueles que sabem escrever, e nunca se exprimirá o suficiente a miséria daqueles que não sabem, daqueles que são prisioneiros da fala ou do silêncio, do instante, do frente a frente. Que infelicidade não poder escrever cartas de amor, não poder escrever aos amigos, aos filhos, não poder lê-los, ser prisioneiro da ausência ou da separação! A escrita é um luxo, a escrita é uma felicidade, a escrita é uma liberdade. Que a injustiça venha intrometer-se aí, como de fato acontece, torna a injustiça ainda mais odiosa.

Uma obra, portanto, e uma obra de arte às vezes. Uns farão de suas cartas poemas, em verso ou em prosa, ensaios, confissões, sátiras, romances por vezes… Não é Madame de Sévigné que quer. A verdade é que a correspondência é também um gênero literário, claro que o mais difundido, e um daqueles, note-se de passagem, que melhor sobrevive às modas e aos séculos. Tenho mais prazer em ler a correspondência de Flaubert, George Sand, Turguiéniev ou Maupassant, do que ler ou reler seus romances. Nela eles são menos rebuscados, menos estetas, menos tagarelas, e mais verdadeiros. A correspondência de Abelardo com Heloísa, mesmo decepcionante, sobreviveu melhor que seus tratados, que agora só interessam aos eruditos. Depois, amo, na correspondência, que cada qual possa procurar nela o pequeno pedaço de si que não mente. Pois pode-se mentir numa carta como na fala, e talvez com mais facilidade. Mas isso é trair a linguagem, mas isso é trair a escrita, mas isso é trair o outro, e a si. As verdadeiras cartas são as cartas verdadeiras. É pelo que valem. É pelo que são tocantes. O vocabulário conta menos do que a sinceridade. O talento, menos do que o amor e a coragem.

Outros farão desenhos, ilustrações, colagens, e decorarão até os envelopes que endereçam. Por que não? A forma fala também. E toda beleza é boa. Escrevo este texto para o catálogo de uma exposição, no Museu do Correio. Quantos envelopes ornados, engraçados, originais! Quantas obras de arte em miniaturas! Não teria imaginado, sem essa exposição, até onde ia a inventividade de nossos contemporâneos, em todo caso de alguns deles, sua criatividade, seu talento por vezes. Quantos cuidados para uma única carta, para um único leitor! A exposição as trai um pouco, com a publicidade; mas é apenas uma indiscrição fugidia. Logo elas retornarão à obscuridade de onde vêm, com a qual a maioria se contenta, com seus pequenos envelopes discretos, corriqueiros, indistintos, e isso é bonito também, nesse anonimato da multidão, nessa intimidade inumerável do correio. Esses milhões de cartas que circulam todos os dias, em todos os países, como um gigantesco zunzum silencioso, como um formidável e imperceptível murmúrio, todos esses pequenos riachos de papel e de tinta, que formam como que um mar, que arrastam nossos segredos, nossas confidências, nossas lágrimas, e tudo o que é preciso para isso, organização, trabalho, humanidade inteligente e fiel (o que mais simples do que uma carta? O que mais complexo do que o Correio?), essa é uma das imagens mais verdadeiras de nossas vidas, todas tecidas de solidão e de desejos, de palavras e de silêncios, de amor e de cólera, todas condenadas à separação e todas a conjurando!

Uma carta pode sobreviver, e sobrevive às vezes, à morte de quem a escreve ou a recebe. Isso dá a ambos, quando pensam nisso, uma apreciação mais justa de sua fragilidade, de sua importância para o outro, um pelo outro, também do peso de cada palavra. Não é esse o caso de todas as cartas (muitas são de pura convenção, de pura rotina, de pura ou impura polidez), mas esse é o caso daquelas que contam, das únicas que merecem ser escritas, mesmo as mais simples, mesmo as mais nuas. O estilo não é o que importa. A correção não é o que importa. Uma carta vale mormente por sua intimidade, por sua doçura, pelo que contém de amor ou de segredo. Todo mundo pode escrever uma, pelo menos todos os que sabem escrever. Basta ser verdadeiro. Basta escrever o mais perto possível da vida como ela é, tal como parece, tal como passa e permanece, nossa pobre e pequena vida de mortais, como à espera de sabe-se lá o que, ou de sabe-se lá demais, como que à espera de si mesma, como que privada de si, e no entanto viva, tão viva, tão frágil, tão pungente de fraqueza e de banalidade, tão desamparada, tão desarmada, tão humildemente única e comum, como um milagre sempre malogrado, sempre recomeçado, nossa pobre vida de terrenos, nalguma parte do tempo, nalguma parte do universo, nossa pobre vida de humanos, sempre exposta ao amor e ao sofrimento, à solidão e ao encontro, e isso forma tão poucas coisas que cabe, ou quase, dentro de um envelope…Nada com que fazer uma história, nada com que fazer um romance. Justo o tempo de viver um pouco, de amar um pouco, de escrever um pouco – justo o tempo de enviar algumas cartas… Escrevo-te para te dizer que te amo e que vou morrer, para dizer que estou vivo, vivo ainda, e muito feliz de ser teu amigo, e muito feliz de ser teu amante. “Na medida em que somos sozinhos, o amor e a morte se aproximam.” Isso, que foi escrito numa carta, diz a verdade de todas.

Nossas cartas se parecem conosco, desde que o queiramos um pouco, e mesmo, às vezes, quando não o queremos. Frágeis como nós. Irrisórias como nós. Bela por vezes. Pobres e preciosas, corriqueiras e singulares, quase sempre. Um pouco de nossa alma introduziu-se ali, na pouca espessura de um envelope. Um pouco de nossa vida, na loucura do mundo. Um pouco do nosso amor, no deserto das cidades.

Por que se escreve uma carta? para habitarmos juntos a essencial solidão, a essencial separação, a essencial e comum fragilidade. Para descrever o tempo que está fazendo, o tempo que está passando. Para contar o que nos tornamos, o que somos, o que esperamos. Para exprimir a distância, sem a suprimir. O silêncio, sem o corromper. O eu, sem fechar nele. Isso não substitui a fala. Isso não substitui nada. E nada, tampouco, o substitui: as verdadeiras cartas, aquelas que gostamos de receber, são gratuitas e insubstituíveis, como a vida, como o amor, como um presente e são um presente. “Não é nada, sou eu”, escreve-me um amigo, “venho dizer-te que te amo muito, muito…” Não é nada, ou quase nada, contudo um pedaço do mundo e da alma, transmitido como que por milagre, tão leve na mão, tão profundo no coração, tão próximo da grande distância.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

MEIOS TELEMÁTICOS - Mudança na CLT entra em conflito com súmula do TST


MEIOS TELEMÁTICOS
Mudança na CLT entra em conflito com súmula do TST
Por Marcos de Vasconcellos

Da noite para o dia, a Súmula 428 do Tribunal Superior do Trabalho ficou ultrapassada. Com a aprovação da Lei 12.551/11, que equipara a subordinação por telefone ou via internet à subordinação presencial, a súmula que afirma que celulares ou pagers não caracterizam sobreaviso terá de ser modificada. Segundo entrevista publicada pelo jornal Valor Econômico com o presidente do TST, o ministro João Oreste Dalazen, será.

A lei sancionada pela presidente Dilma Rousseff no meio de dezembro diz que "os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio”. Com a possível anulação da súmula, o uso de celulares corporativos, computadores ou tablets poderá passar a contar como sobreaviso.

Até que seja feita a mudança anunciada por Dalazen, a súmula, que deveria “servir de farol”, segundo o diretor de Assuntos Legislativos da Associação Nacional de Magistrados do Trabalho (Anamatra), o juiz Germano Silveira de Siqueira, será, provavelmente, deixada de lado em prol da lei.

O problema, porém, é que no cabo-de-guerra entre Consolidação das Leis do Trabalho e súmula, decisões em processos semelhantes poderão apontar para sentidos diametralmente opostos, até que a mudança da Súmula 428 seja feita. “Todos têm liberdade para entender e aplicar a súmula diante da nova realidade normativa. Os próprios magistrados podem recontextualizá-la à luz da nova lei”, diz Siqueira.

Atualmente, a Súmula 428 tem a seguine redação: "O uso de aparelho de intercomunicação, a exemplo de BIP, pager ou aparelho celular, pelo empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço. "

Marcos de Vasconcellos é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 12 de janeiro de 2012
http://www.conjur.com.br/2012-jan-12/regulacao-teletrabalho-clt-entra-conflito-sumula-tst?utm_source=twitterfeed&utm_medium=facebook

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

A CRIAÇÃO DE SINDICATO É UM DOS NEGÓCIOS MAIS SEDUTORES E MAIS RENTÁVEIS NESTE PAÍS


Sindicato no Brasil virou negócio, diz Dalazen
Para o presidente do Tribunal Superior do Trabalho, ministro João Oreste Dalazen, a estrutura sindical no Brasil é falha, viciada e atrasada. Em entrevista concedida ao jornalista Paulo Celso Pereira, da revista Veja, Dalazen criticou a demora do Brasil em ratificar a convenção 87 da Organização Internacional do Trabalho, que trata da liberdade sindical. “Nosso país está entre os poucos de economia capitalista que ainda não o fizeram”, afirmou.

Do modelo sindical vigente, o ministro também criticou a forma como as entidades geram receita. “Eles [os sindicatos] são criados, na maioria, não para representar as categorias, mas com os olhos na receita auferida pela contribuição sindical, que é uma excrescência. É dinheiro público transferido para entidades sindicais que o gastam sem prestar contas.” Por isso, define o modelo brasileiro como “sombrio”.

Dalazen, aos 58 anos, está perto de completar seu primeiro ano na presidência do TST. Lá, orgulha-se da celeridade da resolução dos conflitos trabalhistas pelo tribunal, mas não deixa de lamentar a demora na execução das decisões – gargalo que afeta todo o Judiciário brasileiro.

Leia abaixo a íntegra da entrevista do ministro João Oreste Dalazen à Veja

Sindicato no Brasil virou negócio

O presidente do Tribunal Superior do Trabalho diz que a maioria das entidades sindicais não representa ninguém e existe apenas para embolsar o imposto pago pelos contribuintes

Nem reforma política, nem reforma tributária. Para o gaúcho João Oreste Dalazen, presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), a reforma mais urgente hoje no Brasil é a sindical. Depois de 31 anos atuando na solução de litígios entre empregados e empregadores, o ministro traça um perfil sombrio da situação trabalhista no país. Os sindicatos são numerosos, não têm poder de barganha junto às empresas e, em geral, estão interessados apenas em uma fatia do bilionário bolo da contribuição sindical que todo trabalhador é obrigado a recolher. Dalazen considera urgente o Brasil assinar a convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que dá ao trabalhador ampla liberdade de escolher e contribuir para o sindicato de sua preferência. Em vez de enfraquecê-los, ele explica, isso fortaleceria os bons sindicatos. Hoje com 58 anos, Dalazen tem uma trajetória rara na magistratura. Nascido em uma família pobre, foi engraxate, lavador de carro, vendedor de revista, cobrador, balconista, garçom e office boy até ingressar, por concurso, no serviço público.

A demissão do ministro do Trabalho é um sintoma de que exista muita coisa errada no sindicalismo brasileiro?
Há uma grave anomalia na organização sindical brasileira, a começar por essa desenfreada e impressionante proliferação de sindicatos, que está na contramão do mundo civilizado. A redução do número de sindicatos fortalece a representatividade e dá maior poder de barganha. Não se conhece economia capitalista bem-sucedida que não tenha construído um sistema de diálogo social através de sindicatos representativos e fortes. No Brasil, infelizmente, o panorama é sombrio.

Por quê?
Aqui, os sindicatos, em sua maioria, são fantasmas ou pouco representativos. O Brasil vive uma contradição. A Constituição prevê o regime de sindicato único. Só deveria haver uma entidade representativa de cada categoria em determinada área. Na prática, há uma proliferação desenfreada de sindicatos. Isso se explica porque a criação de sindicato d um dos negócios mais sedutores e mais rentáveis que se podem cogitar neste país. O Brasil tem hoje mais de 14000 sindicatos oficialmente reconhecidos, e neste ano o Ministério do Trabalho recebeu uma média de 105 pedidos de registro por mês. Eles são criados, na maioria, não para representar as categorias, mas com os olhos na receita auferida pela contribuição sindical, que é uma excrescência. E dinheiro público transferido para entidades sindicais que o gastam sem prestar contas.

O senhor tem alguma sugestão para reverter esse quadro?
O Brasil precisa ratificar com urgência a convenção da Organização Internacional do Trabalho sobre a liberdade sindical. Nosso país está entre os poucos de economia capitalista que ainda não o fizeram. Essa convenção consagra a ampla liberdade de criação de sindicatos, de filiação, de contribuição ou não. A extinção da contribuição sindical é fundamental. Mas a reforma sindical no cenário político de hoje infelizmente é remota. Existe sólida rede de interesses atraigados há décadas.

O senhor acha natural a relação entre partidos políticos e sindicatos, com algumas centrais semio extensões de partido?
É natural a filiação de entidades sindicais a partidos políticos com os quais elas se sintam mais identificadas. A questão está em saber se essa identificação com os partidos políticos atende aos interesses nacionais, porque nem sempre isso se dá. É preciso considerar que há sindicatos e sindicatos, líderes sindicais e líderes sindicais. Nem sempre são os mais saudáveis os interesses defendidos pela liderança sindical com repercussão no mundo político.

O Supremo Tribunal Federal decidiu, recentemente, unificar as regras de greve para os trabalhadores da iniciativa privada e do serviço público. São situações realmente semelhantes?
A greve, no campo privado,é um direito sacrossanto condicionado apenas à observância de algumas formalidades para a deflagração. No campo público, a Constituição assegurou aos servidores o direito à negociação coletiva e à greve, mas previa que esse direito fosse disciplinado por uma lei complementar específica. Infelizmente, até o momento não sobreveio essa lei, e o quadro que se vê hoje, em grande medida derivado desse vácuo, é desalentador, para dizer o mínimo. Há greves que descambam muitas vezes para a violência. Outras que se prolongam meses a fio em detrimento da população destinatária do serviço público. Elas são provocadas, ou intensificadas, pela impossibilidade do desconto dos dias de paralisação.

O senhor defende a existência de limites para a greve de servidores públicos?
Nesse vácuo de legislação, o Supremo decidiu que se impõe às greves no serviço público a aplicação da lei que rege a greve na iniciativa privada - o que significa dizer que a participação em greve no serviço público implica a manutenção dos serviços essenciais em funcionamento e o desconto obrigatório dos dias não trabalhados. Na prática, não é isso que acontece. Os funcionários dos Correios, por exemplo, ficaram parados durante 28 dias e o governo só descontou sete. Considero isso ilegal.

Os juízes federais e do Trabalho também cruzaram os braços recentemente.
Estou entre aqueles que sustentam que determinadas categorias não têm o direito de deflagrar greve. O juiz não é um servidor público, mas um agente do estado, e, portanto, a greve no setor torna refém toda a sociedade. Os juízes devem dar o exemplo. A greve atinge e prejudica as pessoas menos favorecidas da sociedade, ou seja, os milhares de reclamantes que pedem o reconhecimento de direitos essenciais e inadiáveis para sua própria subsistência. O mesmo se aplica aos militares e às polícias.

A Justiça do Trabalho enfrenta o mesmo processo de descrença que a Justiça comum?
A Justiça do Trabalho construiu uma imagem de rapidez na solução dos litígios, seja pela conciliação, seja pela intervenção do juiz, mas não obteve até aqui o mesmo 6xito na obtenção efetiva dos direitos reconhecidos nas sentenças. Tínhamos em setembro 2,45 milhões de processos na fase de execução, ou seja, em que os credores até aquele momento não haviam conseguido obter o direito já assegurado pela Justiça. A média nacional mostra que apenas um terço dos trabalhadores que têm ganho de causa definitivo consegue receber seu dinheiro. Sentenças sem efeito prático levam à descrença na Justiça. Nós precisamos garantir que os trabalhadores recebam o que lhes foi garantido legalmente.

Então a Justiça trabalhista também tarda e falta?
Precisamos urgentemente revisar e atualizar a legislação que rege a execução trabalhista. E uma legislação anacrônica, defasada e inadequada para os tempos atuais. Ela d da década de 40 do século passado e não dotou o juiz do Trabalho dos mesmos meios de coerção concedidos aos demais juízes pelo Código de Processo Civil. O juiz do Trabalho é o único sem força legal para exigir a cobrança de débitos derivados de suas sentenças.

A Consolidação das Leis do Trabalho é bem ultrapassada?
São necessárias a revisão e a atualização da CLT. Ela é excessivamente intervencionista e detalhista. A lei deve assegurar patamar mínimo de proteção ao trabalhador e, com sindicatos fortes e representativos, o diálogo entre as partes construiria normas pertinentes, aplicáveis e suportáveis para cada segmento, levando em conta as especificidades de cada um. O modelo trabalhista americano permite um vastíssimo sistema de negociação coletiva sem quase nenhuma intervenção estatal no âmbito legal. Defendo algo semelhante para o Brasil: rede de proteção mínima com sindicatos fortes que construam as normas.

Em tempos de crise, como a enfrentada agora pelos países europeus, esse modelo não deixa o trabalhador vulnerável?
Quando se preconiza o florescimento de um sistema de negociação coletiva sólido e amplo, o pressuposto 6 a existência de sindicatos fortes. Por isso, a primeira das reformas 6 a sindical. Com sindicatos fortes como os têm os Estados Unidos, a Espanha e a Alemanha, não há risco de que a negociação se trave em nível de desigualdade, mesmo nos momentos de crise. Os sindicatos vão avaliar em que medida podem fazer uma ou outra concessão. Podem achar adequado para aquele momento específico aceitar a redução do salário em troca da estabilidade no emprego. Isso é perfeitamente possível em ambiente de pouca intervenção estatal com a contrapartida de sindicatos fortes.

As varas trabalhistas estilo cheias de processos de funcionários terceirizados. Por que essa forma de contratação é motivo de tanto litígio?
É inegável que a terceirização é um fenômeno econômico irreversível no plano universal. E compreensível que as empresas busquem lançar mão da terceirização como forma de aumentar os lucros pelo barateamento do custo da mão de obra. Todavia, como demonstra a experiência das últimas décadas também em escala mundial, a terceirização tem se revelado em muitos casos um fator de precarização das condições de trabalho e de incremento de acidentes por falta de condições de higiene e segurança. Sentimos falta de uma lei que discipline o assunto. A terceirização desenfreada, sob a forma de locação de mão de obra para fazer frente a necessidades normais da empresa, deveria ser proibida.

Quais são hoje os setores que mais desrespeitam a legislação trabalhista?
Os três maiores litigantes no Tribunal Superior do Trabalho são entes públicos: União, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil. Na iniciativa privada, as instituições financeiras respondem pelo número mais expressivo de ações trabalhistas.

A carga tributária é mesmo a principal responsável pela alta taxa de informalidade do trabalho no Brasil?
Os impostos efetivamente oneram em demasia. Isso pesa ainda mais fortemente sobre as pequenas e microempresas. Não me parece razoável que empresas grandes e pequenas tenham obrigações trabalhistas idênticas. O ideal é criar um sistema que estabeleça as obrigações trabalhistas de acordo com o porte econômico de cada empresa. Seria um mecanismo decisivo para a formalização de milhões de trabalhadores brasileiros que atualmente se encontram na informalidade.

Existem mesmo "bandidos de toga", como disse a corregedora nacional da Justiça?
Penso que foi uma declaração profundamente infeliz, embora não queira tapar o sol com a peneira. E evidente que em toda atividade há os bons e os maus profissionais, mas não se pode generalizar nem se pode tachar com essa gravidade indiscriminadamente os magistrados brasileiros. No entanto, reconheço que 6 necessária a adoção, em alguns casos, de medidas mais firmes pelas corregedorias para a apuração de responsabilidade disciplinar envolvendo magistrados.

O fato de a pena máxima para um juiz ser a aposentadoria compulsória não fortalece a imagem de impunidade junto à população?
A revisão da Lei Orgânica da Magistratura, com a inclusão de outras penalidades, é necessária, mas a aposentadoria compulsória não 6 propriamente uma premiação. Quando se diz que a pena máxima 6 a aposentadoria compulsória, está-se referindo apenas à esfera administrativa, porque depois pode prosseguir a apuração da responsabilidade pela mesma conduta na esfera judicial - e então o juiz pode perder o cargo e a própria aposentadoria.

Mas já houve algum caso de perda do cargo e da aposentadoria?
Desconheço.

O senhor vem de família humilde. De que modo isso influenciou sua vida?
De fato, venho de baixo, de família muito pobre. Fui engraxate, lavador de carro, vendedor de revista, vendedor de pinhão em Curitiba, cobrador, balconista, garçom e office boy. Nunca, porém, deixei de estudar. Na juventude, dediquei-me aos concursos públicos. Fui escriturário e procurador da Caixa Econômica. Fui oficial de Justiça, promotor e professor da Universidade Federal do Paraná, até ingressar na magistratura. Fui talhado na luta. Trabalho mais de doze horas por dia com muito prazer, procurando fazer o melhor Só assim eu consigo dormir a noite inteira em paz com a minha consciência.

Revista Consultor Jurídico, 18 de dezembro de 2011

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

TERCEIRIZACÃO - Reunião no TST mudou rumos da formação jurisprudência - IVES GANDRA MARTINS FILHO




Excelente artigo sobre terceirização nas relações de trabalho. Com a palavra o ministro do TST - IVES GANDRA MARTINS FILHO, publicado em 26/10/2011 no site CONJUR http://www.conjur.com.br/2011-out-26/audiencia-publica-tst-mudou-rumos-jurisprudencia-terceirizacao

AUDIÊNCIA PÚBLICA
Reunião no TST mudou rumos da formação jurisprudência
Por Ives Gandra da Silva Martins Filho

Nos dias 4 e 5 de outubro de 2011, o Tribunal Superior do Trabalho realizou pela primeira vez em sua história uma audiência pública para coleta dos elementos técnicos necessários à melhor compreensão sócio-econômica do fenômeno da terceirização. O objetivo traçado pelo Presidente do TST, Ministro João Oreste Dalazen, que em louvável iniciativa a convocou, era o esclarecimento da Corte, na esteira do que já tem sido feito pelo STF, com vista ao embasamento fático das decisões judiciais, apontando os caminhos da legalidade dessa moderna forma de organização empresarial.

Nesse diapasão, e levando em conta os subsídios fornecidos pelos depoimentos de cerca de 40 especialistas na matéria[1], colhidos nessa audiência pública, podemos estabelecer alguns marcos teóricos que balizem a análise jurídica dos casos concretos com os quais a Justiça do Trabalho tem se deparado ultimamente, refletindo sobre alguns, à luz desses esclarecimentos.

Em que pese o objetivo da audiência pública tenha sido o de obter dados técnicos para melhor compreensão do fenômeno e de seus desdobramentos na vida do trabalhador, todos os técnicos e acadêmicos ouvidos acabaram também por se situar, axiologicamente, diante do fenômeno, canonizando-o ou anatematizando-o.

Se o escopo maior da audiência era o esclarecimento dos ministros do Tribunal, o duelo dialético que se travou nos dois dias da audiência serviu para apresentar, em toda a sua extensão para os mais de 500 assistentes aos depoimentos, os argumentos a favor ou contra a terceirização. Assim, os partidários de uma ou outra posição puderam também aquilatar quais os pontos fortes ou fracos de seus discursos, bem como as vantagens e desvantagens da terceirização, seus perigos e necessárias adequações. A discussão sobre a terceirização em nosso país não será mais a mesma depois dessa audiência pública.

II) A essência do fenômeno econômico da terceirização

Sintetizando os diversos elementos trazidos em contribuição ao posicionamento do TST, podemos dizer que o fenômeno da terceirização é uma realidade econômica de caráter universal e irreversível[2], cuja face perversa deve ser transformada, quer pela via legislativa, quer pela via judicial. Como fenômeno econômico, caracteriza-se pela concentração empresarial na atividade de sua especialização, pela passagem do modelo da empresa verticalizada para o de empresas ligadas a redes de produção:

a) empresas verticalizadas - em que todas as etapas do processo produtivo e todas as espécies de atividade necessárias à sua existência são realizadas por elas mesmas, com seus próprios empregados;

b) empresas ligadas a redes de produção – em que cada qual desenvolve parte do processo produtivo, especializando-se cada vez mais.

Basicamente, teríamos duas espécies de terceirização:

a) prestação ou fornecimento de bens e serviços, em que a empresa prestadora de serviços ou fornecedora de bens realiza em sua sede (ou fora das dependências da tomadora de serviços), com seu equipamento e com seus empregados, determinado serviço ou produz determinado bem, acessório do processo produtivo, entregando o produto acabado para a empresa tomadora dos serviços, como pode ocorrer, v.g., com as atividades de contabilidade, informática ou medição de consumo de água e luz, ou os insumos da indústria automobilística;

b) fornecimento de mão de obra, em que a empresa terceirizada contrata, treina e fornece à empresa principal mão de obra especializada, que, mesmo sendo dirigida e subordinada à empresa terceirizada, trabalha nas dependências da empresa principal, eventualmente com equipamento da própria empresa beneficiária do labor, como pode ocorrer, v.g., nos casos de copa, cozinha, vigilância, asseio e conservação.

A diferença essencial entre as duas modalidades está no local do trabalho do empregado: enquanto na prestação de serviços típica ele trabalha na empresa terceirizada e com equipamento da terceirizada, entregando apenas o bem ou serviço, na locação de mão de obra ele labora nas dependências da empresa tomadora dos serviços, ombro a ombro com os empregados diretos da empresa principal.

Daí a expressão “terceirização”, aplicável fundamentalmente ao fenômeno da intermediação de mão de obra (já que, nas cadeias produtivas de serviços, poder-se-ia falar até de “quarteirização” e assim por diante): entre o trabalhador e a empresa beneficiária direta de seus serviços coloca-se um terceiro, que é a empresa contratante do trabalhador e fornecedora de mão de obra.

III) A terceirização em sua dimensão jurídica

Ninguém discute a legalidade da terceirização de bens e serviços típica, como se dá na indústria automobilística, em que as empresas tomadoras dos bens e serviços são apenas montadoras, recebendo as peças de outras empresas e construindo o automóvel. Já no que diz respeito à locação de mão de obra, ainda que se pretenda também chamá-la de prestação de serviços, a realidade é distinta e demanda a intervenção da Justiça do Trabalho, em face das distorções que pode apresentar.

Realmente, muito se falou na audiência pública do TST sobre terceirização a respeito dos efeitos perversos dessa forma de organização do trabalho:

a) mera redução de custos das empresas tomadoras dos serviços, com sensível redução de salários (e outros direitos laborais) para os trabalhadores, sendo que parte do que lhes seria devido vai para o intermediador de mão de obra;

b) não integração do trabalhador na empresa em que efetivamente presta serviços e que é a real beneficiária de seus esforços;

c) descuido das normas de segurança e medicina do trabalho por parte das empresas terceirizadas em relação a seus empregados (sem contar o fato de que as empresas principais não se preocupariam com esse aspecto), o que tem ocasionado aumento considerável dos acidentes de trabalho;

d) precarização da relação de trabalho, com altos índices de rotatividade da mão de obra terceirizada, a par da inadimplência reiterada das empresas contratadas pelo setor público, sem a responsabilização da administração pelos direitos trabalhistas dos empregados terceirizados, o que transferiria os riscos da atividade econômica para o empregado.

Não se pode negar nenhum deles, mas também não é possível, nem conveniente, tratar o fenômeno como nefasto em sua essência e esperar do TST a sua desconstrução, como pretendido por alguns dos participantes na referida audiência.

Com efeito, a competitividade empresarial própria da economia de mercado, somada ao desenvolvimento tecnológico, aponta para a especialização como o caminho a ser trilhado para se chegar ao aumento da qualidade do bem ou serviço oferecido. Quanto mais especializado é um médico, advogado ou fornecedor, mais passa a ser procurado, por atender melhor à necessidade específica das pessoas.

Nesse sentido, a terceirização não é um mal em si mesmo, mas um fenômeno econômico generalizado que deve ser compreendido em sua essência e corrigido, pela intervenção estatal no domínio econômico, naquilo que atenta contra os direitos humanos fundamentais, entre os quais o do trabalho.

IV) A evolução jurisprudencial do tst quanto à terceirização

A evolução jurisprudencial no âmbito do TST em torno do fenômeno da terceirização mostra como esta Corte tem buscado uma posição moderada, que garanta os direitos dos trabalhadores em face das modernas técnicas de organização empresarial:

a) Súmula 256 (editada em 30/09/1986) – admitia a terceirização, sob a modalidade de locação de mão de obra, apenas nos casos de trabalho temporário (Lei 6.019/74) e vigilância (Lei 7.102/83), sendo extremamente limitativa, uma vez que, no entender de então do TST, somente as atividades que expressamente fossem legalmente elencadas como passíveis de serem exercidas por empresas especializadas é que poderiam ser terceirizadas;

b) Súmula 331 (editada em 21/12/1993) – ampliava as hipóteses em que se admitia a terceirização sob a modalidade de locação de mão de obra permanente, para abranger os serviços de conservação e limpeza, além de outros especializados ligados à atividade-meio do tomador dos serviços (categoria conceitual distintiva entre atividade-fim e atividade-meio introduzida pelo verbete sumular), tendo em vista a ampliação da competência da Justiça do Trabalho para abranger os entes públicos (CF, art. 114) e a autorização legal da terceirização no setor público (Decreto-Lei 200/67[3]);

c) inciso IV da Súmula 331 (alterado em 18/09/2000) – reconhecimento da responsabilidade subsidiária objetiva da Administração Pública no caso de inadimplência dos direitos trabalhistas por parte da empresa terceirizada, intermediadora de mão de obra, não obstante a vedação expressa do art. 71, § 1º, da Lei 8.666/93;

d) inciso V da Súmula 331 (introduzido em 27/05/2011) – adequação da jurisprudência do TST ao entendimento do STF expresso na ADC 16-DF, no sentido de que, sendo constitucional o art. 71, § 1º, da Lei 8.666/93, somente se pode admitir a responsabilidade subsidiária subjetiva da Administração Pública, nos casos de inadimplência da empresa terceirizada, quando evidenciada a culpa “in vigilando” ou “in eligendo” do ente estatal tomador dos serviços.

É importante conhecer as razões da evolução jurisprudencial do TST, pois ditada pela realidade fática e pelo desenvolvimento legislativo sobre a matéria. Tivemos participação direta na edição da Súmula 331 do TST, ao formular, como membro do Ministério Público do Trabalho, o pedido de revisão da Súmula 256, em face de inquérito civil público instaurado para investigar as condições de terceirização no âmbito do Banco do Brasil[4].

O dilema que deu origem a essa revisão jurisprudencial relacionava-se ao fato de que a Súmula 256 do TST dizia respeito ao universo normativo anterior à Constituição Federal de 1988 e a uma realidade fática ainda de verticalização empresarial.

Com a exigência constitucional do concurso público para toda a administração pública, inclusive a indireta (CF, art. 37, II), tornou-se absolutamente impraticável a contratação, mediante concurso, de pessoal para atividades acessórias em que a exigência de escolaridade mínima afastaria da concorrência aqueles mais afetos à sua realização. Seria o caso dos serviços de limpeza, asseio e conservação. A par do fato de que se mostra impossível qualquer prova prática seletiva dos melhores, num universo que poderia chegar a milhões de concorrentes: quem deixa a vidraça mais limpa ou o chão mais brilhante?

Com vistas a resolver a questão das atividades de baixa escolaridade mínima, o TST passou a aplicar critério que nos parece não superado até o momento, para traçar a linha divisória entre a licitude e a ilicitude em matéria de terceirização sob a modalidade de locação de mão de obra: qual a espécie de atividade desenvolvida pelo trabalhador terceirizado? Se está ligada, pelo seu conteúdo ocupacional, à atividade-fim ou à atividade-meio da empresa principal, tomadora dos serviços do trabalhador, seguindo na esteira da definição traçada no § 2º do art. 581 da CLT[5].

Nesse sentido, esta Corte tem considerado ilícita a terceirização permanente de mão de obra para atividade-fim da empresa tomadora dos serviços, nos termos da referida Súmula 331, em seu inciso III, impondo o reconhecimento do vínculo empregatício direto com a tomadora dos serviços nesses casos (inciso II).

Assim, é lícita a terceirização de mão de obra para atividade-meio da empresa principal, desde que não haja pessoalidade ou subordinação no fornecimento de mão de obra, de modo a não restarem caracterizados os requisitos da relação de emprego com a empresa tomadora dos serviços, nos moldes do artigo 3º da CLT.

De fato, a empresa terceirizada se compromete a realizar o serviço na empresa principal, mas não com esse ou aquele trabalhador concreto, e sem que haja ingerência direta da empresa principal ou de seus prepostos no comando dos trabalhadores terceirizados. No entanto, apenas essa cautela não é suficiente: daí ter o TST garantido, pelo inciso IV da Súmula 331, a responsabilidade subsidiária da tomadora dos serviços em caso de inadimplência dos direitos trabalhistas por parte da prestadora dos serviços.

No setor público, as distorções que se tem visto em matéria de terceirização, em face de a Lei de Licitações adotar como critério o menor preço do bem ou serviço, fazem com que as irregularidades se multipliquem:

a) empresas de fachada, que loteiam entre si os contratos com o setor público, possuindo, muitas vezes, apenas uma sala, telefone e computador, e desaparecendo do mercado quando recebem valor substancial de recursos financeiros ou não têm condições de honrar as condições mínimas a que se comprometeram para vencer a licitação;

b) empregados terceirizados permanentes mantidos nos órgãos públicos, não obstante a mudança das empresas que os contratam, apontando nitidamente para a pessoalidade na prestação dos serviços (mudam os uniformes, permanecem os empregados nos mesmos postos de trabalho na tomadora dos serviços).

Justamente diante dessa realidade fática de exploração indevida do trabalho humano é que o TST acabou por reconhecer, mesmo em face da literalidade do art. 71, § 1º, da Lei 8.666/93, a responsabilidade subsidiária também da administração pública pelos débitos trabalhistas não satisfeitos pelas empresas terceirizadas. Afinal, não se admite que seja justamente o trabalhador que fique ao desamparo, quando a administração se beneficiou de seus esforços.

Nesse diapasão é que, recém ingresso no TST, votei em 2000 pelo reconhecimento da responsabilidade subsidiária da administração pública, não obstante vir para esta Corte diretamente de experiência profissional na Presidência da República, mas justamente por não ter perdido o prisma visual do Ministério Público, vivenciando as injustiças sofridas pelos trabalhadores terceirizados devido à forma de exploração de seus serviços.

Por dez anos, o inciso IV da Súmula 331 do TST foi bombardeado pelos entes públicos, em face da literalidade do art. 71 da Lei de Licitações, a ponto de um dos auditórios mais hostis que já enfrentei ter sido de advogados públicos em palestra sobre o tema no STJ[6].

A insistência destes, entretanto, acabou por ver-se premiada, pela decisão do STF na ADC 16-DF, afastando a responsabilidade subsidiária objetiva do Estado nos casos de inadimplência das empresas terceirizadas que contrata.

Com efeito, o TST, na redação anterior do inciso IV da Súmula 331, admitia a responsabilidade subsidiária da Administração Pública, em face das teorias da responsabilidade objetiva e do risco administrativo (CF, art. 37, § 6º), como também em homenagem aos princípios constitucionais da valorização e primado do trabalho humano e da proteção ao trabalhador (CF, arts. 1º, IV, 170 e 193). Entendia a Suprema Corte Trabalhista que não se poderia admitir que a Administração Pública se beneficiasse do esforço produtivo do trabalhador e este acabasse sem nada receber, por conta da inadimplência da prestadora de serviços. Sem a mitigação de sua literalidade, o art. 71 da Lei de Licitações apresentaria a face mais perversa do fenômeno da terceirização.

O STF, ao apreciar a Ação Declaratória de Constitucionalidade 16-DF[7], concluiu pela constitucionalidade do art. 71 da Lei 8.666/93, no sentido de afastar a responsabilidade trabalhista subsidiária objetiva dos entes públicos nos casos de inadimplência das empresas prestadoras de serviços por eles contratadas. Entendeu que a responsabilidade trabalhista é sempre contratual e subjetiva, não se admitindo a teoria do risco ou da responsabilidade objetiva da administração em matéria trabalhista[8].

Por outro lado, a discussão travada em torno das exceções à regra da não responsabilização subsidiária, nos casos em que possa ter havido culpa “in vigilando” ou “in eligendo” da Administração Pública, levou o Pretório Excelso à matização da responsabilidade. Assim, conforme a constatação, caso a caso, da culpa da Administração Pública, poderia ser atribuída responsabilidade ao ente público contratante, nos termos do voto do Relator, Min. Cezar Peluso[9].

Em face dessa orientação do STF é que o TST, revendo sua Súmula 331, admitiu apenas excepcionalmente a responsabilidade subsidiária da entidade pública, no caso de ficar evidenciada a culpa “in vigilando” ou “in eligendo” do tomador dos serviços, por irregularidade na licitação ou descaso na fiscalização do cumprimento das obrigações trabalhistas. Ou seja, não com base em presunção ou responsabilidade objetiva, conforme consta do inciso V da referida súmula.

Assim, a jurisprudência atual desta Corte é a de reconhecer a responsabilidade subsidiária em matéria de terceirização:

a) objetivamente no setor privado, pelo simples fato de a empresa terceirizada ser inadimplente quanto aos direitos trabalhistas dos seus empregados;

b) subjetivamente no setor público, quando demonstrada a culpa do ente público tomador dos serviços, seja por irregularidades na contratação, seja por inobservância do dever de fiscalização do cumprimento das obrigações trabalhistas por parte da empresa terceirizada.

Penso ser inconveniente e injusta a ampliação da responsabilidade no setor privado, que já é objetiva, para a solidária, uma vez que o reconhecimento da responsabilidade subsidiária já atende, justa e convenientemente, ao imperativo de resguardar os direitos dos trabalhadores: a prática demonstra que as reclamações trabalhistas de empregados de empresas terceirizadas inidôneas já indicam como reclamadas ambas as entidades patronais, ou seja, a empresa prestadora e a entidade tomadora dos serviços terceirizados.

A passagem para a responsabilidade solidária levaria qualquer empregado, quer a empresa terceirizada fosse, ou não, inidônea, a ir reclamar direta e exclusivamente contra o tomador dos serviços, desnaturando absolutamente as relações entre empregados e seus empregadores.

Portanto, ponderados os elementos trazidos pela audiência pública sobre terceirização, concluímos que o critério da distinção por atividade-fim ou atividade-meio continua sendo adequado, devendo, no entanto, ser conjugado com o do local da prestação dos serviços, de modo a não engessar a economia, nem prejudicar o trabalhador. Assim, na terceirização mediante locação de mão de obra, haverá o reconhecimento do vínculo direto com a tomadora de serviços se estes forem realizados para atividade-fim em suas dependências, no setor privado, ou com o reconhecimento da responsabilização subsidiária em caso de inadimplemento da empresa terceirizada no setor público.

V) Terceirização no setor de telecomunicações

Passando às hipóteses concretas que têm sido discutidas pelo Tribunal Superior do Trabalho, uma das mais emblemáticas é a da terceirização dos serviços de “call center” por empresas de telecomunicações, uma vez que, supostamente, essa tarefa estaria ligada à atividade-fim da tomadora de serviços.

A Lei 8.987/95, regulando o regime de concessão de serviços públicos, admitiu expressamente a contratação, pelas concessionárias dos serviços de telecomunicações, de terceiros para o desenvolvimento não apenas de atividades acessórias e complementares aos serviços, mas inclusive para atividades inerentes ao serviço concedido[10].

Por sua vez, a Lei 9.472/97, versando especificamente sobre a organização dos serviços de telecomunicações, chegou a definir no que consiste o cerne da atividade – oferta de telecomunicação – e, novamente, a admitir explicitamente a terceirização de atividade-fim ou meio das empresas concessionárias de serviços de telecomunicações[11].

Por esse prisma, a validade da terceirização de um serviço pela concessionária de serviço telefônico parece clara, diante do disposto na lei, inclusive para atividade-fim da tomadora dos serviços. No entanto, havendo a Súmula 331 do TST, caberia perquirir sobre a natureza da atividade de “call center”, para verificar sua caracterização como atividade-fim ou como atividade-meio, seja ela inerente, acessória ou complementar da concessão de serviço de telecomunicações. A rigor, tal análise seria despicienda, dado que a súmula não pode ir contra a lei e o caso dos serviços de telecomunicações seria de exceção a ser contemplada pela jurisprudência.

Ora, o serviço de “call center”, em toda a sua amplitude, caracteriza-se pela intermediação da comunicação entre os clientes e a empresa, e hoje, bastante disseminado, está presente não apenas em diversas áreas do mercado, como bancos, hospitais e empresas de transporte, mas também no próprio poder público, racionalizando o contato entre os cidadãos e os entes da administração.

Diante dessa realidade, o fato de uma empresa desenvolver atividade vinculada ao serviço telefônico não é o bastante para que sua finalidade precípua abarque tal serviço especializado como inerente (nos termos do art. 581, § 2º, da CLT), igualmente presente em empresas ligadas a ramos tão diversos e sem qualquer semelhança com os serviços de telefonia, utilizando “call centers” com igual proveito.

Assim, o serviço de “call center”, que não se confunde com a efetiva oferta de telecomunicação, somente pode ser entendido como atividade-meio da concessionária de telefonia, da mesma forma como na estrutura funcional de qualquer outra empresa que dele se utilize, à exceção da própria empresa especializada, afigurando-se, portanto, passível de terceirização.

O mesmo se diga em relação aos serviços de instalação e manutenção de linhas telefônicas. Se, nos termos das Leis 8.987/95 e 9.472/97, podem ser terceirizados, independentemente da natureza de atividade-fim ou meio das empresas de telecomunicações, o fato é que, além do mais, não são inerentes à oferta de telecomunicações.

Como já referido acima, se o serviço pode ser prestado fora da empresa principal e com equipamento da empresa terceirizada, não há locação de mão de obra, mas efetiva prestação de serviços, com entrega do serviço ou do bem acabado. No caso da instalação e manutenção das linhas telefônicas, estas são o meio através do qual a telecomunicação se dá. O que a concessionária oferece é a telecomunicação. O meio físico pode ser construído, montado e conservado por empresas terceirizadas. Pretender que a instalação e manutenção das linhas telefônicas seja atividade-fim da empresa concessionária é o mesmo que dizer que as máquinas de uma fábrica de automóveis devem ser fabricadas por elas mesmas, como algo inerente à sua atividade.

VI) Terceirização no setor bancário

Situação similar é a que de dá na área bancária. Os serviços típicos de bancário, pelo seu conteúdo ocupacional, são de natureza burocrática, ligados ao depósito de dinheiro, saque e compensação de cheques, abertura de contas, realização de operações de crédito, financiamento e investimento, pois o que caracteriza um banco e uma instituição financeira é o comércio com a mercadoria de maior fluidez do mundo, que é o dinheiro, captando-o, guardando-o e fazendo-o multiplicar-se através da atividade creditícia[12].

Ora, no setor bancário, essas atividades de cunho burocrático que compõem o dia a dia do bancário, nas agências, nos balcões ou nos bastidores da sede ou das filiais das instituições financeiras, integram o núcleo da atividade-fim dos bancos. Poderiam ser terceirizadas?

O Conselho Monetário Nacional, invocando a Lei 4.595/64, editou a Resolução 3.954/11, prevê que a terceirização de serviços bancários pelos denominados “correspondentes no país”, que seriam a longa manus dos bancos para atendimento em locais onde não chegam as agências bancárias[13]. O modelo já havia sido criado em 2000 pela Resolução 2.707 do Banco Central.

Antes da adoção do sistema de correspondentes, cerca de 1.700 municípios dos mais de 5.000 existentes no Brasil não contavam com nenhum serviço bancário. Atualmente, passados mais de 10 anos da adoção da sistemática, os Correios, supermercados, farmácias, revendedoras de automóveis, lotéricas e outras empresas locais ou redes nacionais foram contratadas para prestar, além de seus próprios, serviços bancários à demanda contida.

Para se ter uma ideia da capilaridade do sistema, capitaneado hoje pelo Banco Postal, serviço acessório prestado pela ECT, verifica-se que o total de agências bancárias no Brasil gira em torno de 20.000, que se somam a cerca de 8.500 postos de atendimento e 45.000 pontos de caixas eletrônicos. Ora, o total de correspondentes em 2011 no Brasil ultrapassa a cifra de 160.000[14].

A resolução supramencionada elenca quais as atividades que podem ser desenvolvidas pelos correspondentes, incluindo recepção de pedidos de abertura de contas e de fornecimento de cartões de crédito, bem como a realização de pagamentos, de operações de crédito e movimentação de contas, todas elas atividades tipicamente bancárias[15].

Ora, a resolução em tela deixa claro, por outro lado, que essas atividades delegadas aos correspondentes são realizadas nos estabelecimentos dessas empresas “terceirizadas”, proibindo-se que adotem qualquer configuração que dê ao público a impressão de que se trata de agências bancárias, mas exigindo, por outro lado, que informem serem prestadoras desses serviços e que tenham vínculo empregatício formal com os trabalhadores que atuam no atendimento a clientes e usuários dos serviços bancários delegados[16].

Como se pode perceber, o local da prestação de serviços é elemento que deve ser conjugado ao da diferenciação entre atividade-fim e atividade-meio como critério de verificação da legalidade da terceirização, fixando a linha divisória entre o lícito e o ilícito.

Assim, a terceirização de atividade-fim da tomadora dos serviços só se admite na hipótese de real prestação de serviços fora do estabelecimento da empresa principal, como ocorre no caso dos correspondentes bancários, em que estes possuem seus próprios estabelecimentos, operam com seus próprios equipamentos e contratam e dirigem o trabalho de seus próprios empregados.

Situação distinta, que nem se enquadra na normativa do BACEN, nem se admite legalmente, é a da terceirização de serviços bancários dentro das próprias agências bancárias. Exemplo dessa prática é a contratação de empresas terceirizadas, que operam dentro das próprias agências bancárias, na captação de clientes através de “promotores de vendas” nelas postados.

Nessa hipótese, trabalhando o terceirizado ombro a ombro com o bancário em agência e atividades cujo conteúdo ocupacional não se distingue daquele próprio do bancário, tem ele o direito ao reconhecimento do vínculo empregatício direto com o banco que se beneficia de seus serviços.

Do contrário, teríamos o esvaziamento da própria noção de atividade bancária sob o prisma ocupacional, pois as atividades elencadas na resolução retromencionada do Bacen são tipicamente bancárias, podendo ser terceirizadas apenas sob a modalidade de correspondência, com o fito de capilarizar a atuação dos bancos, mas nunca de desonerar os bancos dos direitos trabalhistas dos bancários.

Nesse sentido, é licita a terceirização de atividades bancárias por correspondentes, sem que se constituam os empregados das empresas correspondentes em bancários, pois cada uma delas tem a sua atividade principal e própria, atuando acessória e subsidiariamente como correspondentes bancários.

O fato de, tópica e ocasionalmente, o volume de atividade bancária, pelas circunstâncias do local, em face justamente da quase absoluta ausência de agências bancárias, ser maior que o da atividade principal do correspondente não pode ser elemento que autorize o enquadramento do empregado da empresa correspondente como bancário. Pretender o contrário importaria desvirtuamento do quadro funcional da empresa correspondente (que teria bancários e empregados comuns, conforme a oscilação da demanda bancária) e poderia provocar o desinteresse da empresa terceirizada em ser correspondente, já que, não podendo ter, efetivamente, agências bancárias, por vedação resolutiva, enfrentaria o dilema de continuar a contribuir para a capilarização do sistema financeiro, o que só traria prejuízos para a sociedade.

VII) O cooperativismo de trabalho e a terceirização

No Brasil, o marco jurídico do cooperativismo foi a Lei 5.764/71, que estabeleceu o regime jurídico das cooperativas, independentemente de seu objeto, definindo-as como associações sem fins lucrativos que congregam pessoas que se obrigam a contribuir com bens e serviços para o exercício de alguma atividade econômica em proveito comum[17]. As mais típicas cooperativas são as agrícolas, as de crédito e as de trabalho.

No caso das de crédito, a lei proíbe que sejam chamadas de “bancos” (art. 5º, parágrafo único), porque não o são, ainda que possam guardar semelhança com essa atividade. Da mesma forma, as de trabalho não se confundem com empresas, tanto que o proveito comum que seus associados auferem da cooperativa é a colocação no mercado como trabalhadores cooperados, garantindo-se a inexistência de vínculo de emprego entre o cooperado e a empresa tomadora dos seus serviços (CLT, art. 442, parágrafo único[18]).

O parágrafo único do art. 442 da CLT, introduzido pela Lei 8.949/94, que salvaguardava o genuíno espírito cooperativo, acabou, no entanto, no Brasil, a gerar o fenômeno das falsas cooperativas de trabalho, criadas pelos empregadores para furtar-se ao pagamento dos direitos trabalhistas. Como procurador do trabalho, instaurei vários inquéritos contra cooperativas de trabalho no setor médico, em que hospitais aliciavam médicos para subscreverem estatutos de criação de cooperativa médica e depois obrigavam plantonistas a se filiarem à cooperativa, sob pena de serem dispensados dos plantões.

Justamente por vivenciar essa triste realidade é que, vindo a integrar o TST como ministro, e sendo designado pela Corte para representá-la como observador na 90ª Conferência Internacional do Trabalho em Genebra, não pude deixar de apresentar, na Comissão sobre Cooperativas de Trabalho, os problemas que enfrentávamos no Brasil com as cooperativas de fachada, espe­cialmente no meio rural (o intermediador denominado “gato” alicia trabalhadores em várias regiões, formando uma cooperativa fictícia e levando-os às fazendas em época de colheita, com o que deixam esses trabalhadores de receber todos os seus direitos trabalhistas). Com isso, incluiu-se no texto da Recomendação 193 da OIT, sobre cooperativas de trabalho, dispositivo por nós sugerido, coibindo a prática[19].

Se, por um lado, o problema das “pseudocooperativas” foi enfrentado e disciplinado, por outro, o que pudemos verificar no contato com representantes de todos os países integrantes da OIT é o caráter altamente positivo do cooperativismo de trabalho, como elemento de estímulo à empregabilidade e de autonomia laborativa do cidadão. Tanto que a referida recomendação teve o cuidado de incluir dispositivo que cuida do tratamento isonômico entre empresas e cooperativas de trabalho nas relações com o Poder Público[20].

Justamente por isso causa espécie o termo de conciliação judicial imposto pelo Ministério Público do Trabalho à União, para que não admitisse em licitações de serviços cooperativas de trabalho[21]. O termo de ajuste de trabalho, a par de inconstitucional, já que vai de encontro aos arts. 5º, XVIII, e 174, § 2º, da Constituição Federal[22], atenta contra a própria normativa internacional, alijando cooperativas e seus associados do mercado de trabalho ofertado pelo setor público. Com efeito, a Carta Política, além de colocar como missão do Estado estimular e apoiar o cooperativismo, impede a intervenção estatal no funcionamento das cooperativas.

O termo de conciliação representa intervenção indevida na própria sobrevivência das cooperativas, desestímulo à sua atuação, a par de atentar flagrantemente contra um dos pilares do devido processo legal, que é a garantia do contraditório, uma vez que o termo foi tomado em processo ajuizado contra a União, sem defesa das cooperativas atingidas ou do ente confederativo que as congrega, em matéria que as afeta diretamente!

Não se argumente que a prestação de serviços como objeto de cooperativa refoge da autorização legal, pois esta é ampla, ao tratar do “proveito comum” que a atividade econômica desenvolvida pela cooperativa pode gerar. Com efeito, se, em sua origem, as cooperativas eram exclusivamente de produção, o desenvolvimento do cooperativismo em âmbito mundial mostrou todas as potencialidades do fenômeno, inclusive o do cooperativismo de trabalho. Neste, o proveito comum auferido pelos associados é justamente a oferta de trabalho e a inserção no mercado dos trabalhadores que, unindo suas forças, oferecem a terceiros os seus serviços, sem uma empresa intermediária, mas com os próprios associados gerindo o seu negócio, sob a forma de cooperativa.

Descartar a priori a possibilidade de cooperativa de trabalho prestar serviços no setor público é tomar as exceções irregulares como regra e estrangular iniciativa que, bem encaminhada, atende adequadamente tanto a administração pública quanto os trabalhadores. Nesse sentido, é digno de nota o fato de ser o Prof. Paul Singer, insigne economista e atual Secretário Nacional de Economia Solidária do Ministério do Trabalho e do Emprego, um dos maiores defensores das cooperativas de trabalho como instrumento de assunção da atividade produtiva pelos próprios trabalhadores, ofertando à comunidade os bens e serviços que desenvolvem[23].

Mantive muitas conversas com o Prof. Paul Singer, discutindo o tema e buscando fórmulas de viabilizar tais cooperativas, a par de combater eficazmente as falsas cooperativas. Tive, inclusive, a oportunidade de visitar, após Seminário sobre o tema[24], uma genuína cooperativa de trabalho do setor de limpeza pública, a COOTRAVIPA, criada pelos moradores das vilas da zona sul de Porto Alegre para viabilizar seu acesso ao mercado de trabalho formal e aos serviços de saúde, pelo ingresso na Previdência Social. Convivendo e almoçando com os associados, para sentir diretamente como se organizavam e trabalhavam esses cooperados, cheguei à seguinte conclusão: se o cooperativismo de trabalho sobreviver à sanha desconstrutiva do Ministério Público, deverá muito ao Rio Grande do Sul e a iniciativas genuínas como à da COOTRAVIPA, em defesa de um modelo que, depurado dos defeitos inerentes a qualquer obra humana, é de fantástica eficácia para a promoção social.

Para que isso ocorra, no entanto, é necessário deixar claro quais são os sinais distintivos da verdadeira cooperativa de trabalho, os quais, inobservados, caracterizam a falsa. As notas características da verdadeira cooperativa de trabalho (promovidas pela Recomendação nº 193 da OIT) são:

a) espontaneidade na criação da cooperativa pelos próprios trabalhadores e não induzida pela empresa;

b) autonomia dos cooperados, que não realizam trabalho subordinado, mas prestação de serviços;

c) autogestão da cooperativa, com seus estatutos, normas e solidariedade entre os associados;

d) liberdade de associação, sem imposição do tomador de serviços para que seus empregados nela ingressem para reduzir encargos sociais;

e) não flutuação dos associados, pois do contrário se está diante de nítido expediente fraudulento para contratação temporária de pessoal em época de safra.

Para dar pleno foro de cidadania às cooperativas de trabalho, de modo a que não sofram a discriminação de que hoje são objeto, mister se faz que seja aprovado o projeto de lei que ora tramita no Congresso Nacional[25] e que garante aos trabalhadores cooperados os mesmos direitos trabalhistas do art. 7º da Constituição Federal. A rigor, se são trabalhadores, é óbvio que gozam desses direitos. Mas a explicitação não é demais para cessar o litígio. A partir dessa concepção, não haverá motivo para a criação de cooperativas de fachada, já que a redução de custos não será possível, sob o prisma salarial.

Nesse sentido, entendo perfeitamente possível a constituição e contratação de cooperativas de trabalho, quer no setor público, quer no setor privado, para a prestação de serviços ou locação de mão de obra, desde que observados os demais parâmetros aplicáveis às empresas terceirizadas que atuam no mesmo setor.

VIII) Conclusão – terceirização sem precarização

Portanto, não se pode pretender impedir a terceirização a todo custo, inclusive contra legem, nem distorcer realidades fáticas que demonstram a possibilidade, viabilidade e conveniência da terceirização de serviços. O que, sim, é necessário é a adoção de medidas que protejam adequadamente os trabalhadores terceirizados, assegurando-lhes não apenas os direitos trabalhistas mínimos, mas também as condições de trabalho seguras e dignas.

Nesse sentido, a audiência pública realizada no TST sobre terceirização foi de excepcional resultado, ao fazer com que ministros, acadêmicos, técnicos, sindicalistas, patrões e empregados pudessem ouvir e refletir sobre as mais diferentes facetas e problemas que a realidade desse fenômeno econômico acarreta. Não tenho dúvidas de que a jurisprudência do TST, nessa matéria, não será a mesma após a audiência, uma vez que, ponderados os vários aspectos e esclarecidas as dúvidas reinantes, poderemos progredir na construção de um mundo do trabalho que, atento à modernidade, não deixe de focar o homem em sua dimensão de trabalhador, centro e fim de toda a atividade produtiva.

[1] Foram depoentes na audiência: A) Sobre Terceirização em Geral: 1) José Pastore, Professor da USP; 2) Ricardo Antunes, Professor da UNICAMP; 3) Gesner Oliveira, Representante do Instituto ABRADEE da Energia; 4) Anselmo Luis dos Santos, Professor da UNICAMP; 5) Lívio Giosa, Presidente do Centro Nacional de Modernização Empresarial – CENAM; 6) Clemente Ganz Lúcio, Diretor Técnico do DIEESE; 7) Márcio Milan, Representante da Confederação Nacional do Comércio – CNC; 8) Maria da Graça Druck de Faria, Professora da UFBA; 9) Márcio Túlio Viana, Desembargador e Professor da UFMG; 10) Nelson Mannrich, Presidente da Academia Nacional de Direito do Trabalho; 11) Rosângela Silva Rassy, Representante do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho – Sinait; 12) Adauto Duarte, Diretor Sindical da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo – FIESP; 13) Artur Henrique da Silva Santos, Presidente da Central Única dos Trabalhadores – CUT; 14) Adriano Dutra da Silveira, Especialista em Gestão Empresarial; 15) Sebastião Vieira Caixeta, Presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho – ANPT; 16) Sônia Bridi, Jornalista Representante da Associação Brasileira das Relações Empresa Cliente – ABRAREC; 17) Renato Henry Sant'Anna, Presidente da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho – ANAMATRA; 18) Márcio Pochmann, Presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA; B) Sobre Marco Regulatório da Terceirização: 19) Sandro Mabel, Deputado Federal; 20) Vicentinho, Deputado Federal. C) Sobre o Setor Bancário-Financeiro: 21) Murilo Portugal Filho, Presidente da Federação Brasileira de Bancos – FEBRABAN; 22) Miguel Pereira, Secretário de Organização da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro – CONTRAF; 23) Magnus Ribas Apostólico, Representante da Confederação Nacional do Sistema Financeiro – CONSIF; 24) Ana Tercia Sanches, Diretora do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região; 25) Thiago D'Avila Fernandes - Representante do Sindicato dos Bancários de Sergipe. D) Sobre Telecomunicações: 26) Carlos Ari Sundfeld, Representante da Associação Brasileira de Telecomunicações – TELEBRASIL; 27) Sávio Machado Cavalcante, Representante do Sindicato dos Trabalhadores em Telecomunicações – SINTTEL/PI. E) Sobre Indústria: 28) Emerson Casali Almeida, Gerente-Executivo da Confederação Nacional da Indústria – CNI; 29) Rodrigo de Lacerda Carelli, Prof. da Universidade Federal do Rio de Janeiro; 30) Fábio Abranches Pupo Barboza, Representante da Associação Brasileira da Industria Têxtil e de Confecção – ABIT; 31) Anselmo Ernesto Ruosso, Representante da Federação Única dos Petroleiros; 32) Paulo Safady Simon, Representante do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo - SindusCon – SP e da Câmara Brasileira da Indústria da Construção – CBIC; 33) César Augusto de Mello - Consultor Jurídico da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Químico – CNTQ; F) Sobre Serviços: 34) Percival Menon Maricato, Central Brasileira do Setor de Serviços – CEBRASSE; 35) Hudson Marcelo da Silva, Representante do Sindicato dos Trabalhadores em Telemarketing da Cidade de São Paulo e da Grande São Paulo - SINTRATEL/SP; 36) Indalécio Gomes Neto, Representante da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias – ABCR; 37) Topázio Silveira Neto, Vice-Presidente do Conselho da Associação Brasileira de Teleserviços – ABT; 38) Flávio Rodrigues, Presidente do Sindicato dos telefônicos do RS – SINTTEL/RS; 39) Celita Oliveira Sousa, Representante da Federação Brasileira das Empresas de Asseio, Conservação, Manutenção e Serviços Terceirizáveis - FEBRAC; da Federação Nacional das Empresas de Segurança e Transporte de Valores - FENAVIST e da Federação do Comércio do Distrito Federal - FECOMÉRCIO/DF; 40) Antonio Rosella, Representante da Força Sindical e da Federação Nacional do Trabalhadores em Empresas de Telecomunicações – FENATTEL. G) Sobre o Setor Elétrico: 41) Diogo Clemente, Representante do Sindicato da Indústria da Energia no Estado de São Paulo – SIESP; 42) Fernando Ferreira Duarte, Representante da Federação Nacional dos Urbanitários - FNU-CUT; 43) Nelson Fonseca Leite, Presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica – ABRADEE; 44) Paulo Henrique Falco Ortiz, Representante do Sindicato dos Eletricitários de São Paulo ; 45) Cláudia Viegas, Representante da Associação Brasileira Das Empresas Geradoras de Energia Elétrica – ABRAGE; 46) Alexandre Donizete Martins, Presidente do Sindicato dos Empregados em Concessionárias dos Serviços de Geração, Transmissão, Distribuição e Comercialização de Energia Elétrica de Fontes Hídricas, Térmicas ou Alternativas de Curitiba – SINDENEL. H) Sobre Tecnologia e Informação: 47) Reges Bronzatti, Representante da Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação – ASSESPRO Nacional; 48) Carlos Alberto Valadares Pereira, Presidente da Federação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de Processamento de Dados, Serviços de Informática e Similares – FENADADOS; 49) Gerson Schmitt, Presidente da Associação Brasileira das Empresas de Software – ABES; 50) Antônio Fernandes dos Santos Neto, Presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Processamento de Dados e Tecnologia da Informação e da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil; 51) Edmundo Machado de Oliveira, Representante da BRASSCOM – Associação Brasileira de Empresas e Tecnologia da Informação e Comunicação.

[2] Cfr. inter alia, Thomas L. Friedman, “O Mundo é Plano” (Objetiva – 2005 – Rio de Janeiro).

[3] “Art. 10. A execução das atividades da Administração Federal deverá ser amplamente descentralizada.

(...)

§ 7º Para melhor desincumbir-se das tarefas de planejamento, coordenação, supervisão e controle e com o objetivo de impedir o crescimento desmesurado da máquina administrativa, a Administração procurará desobrigar-se da realização material de tarefas executivas, recorrendo, sempre que possível, à execução indireta, mediante contrato, desde que exista, na área, iniciativa privada suficientemente desenvolvida e capacitada a desempenhar os encargos de execução”.

[4] Cfr. “Revista do Ministério Público do Trabalho”, Ano IV - nº 7 – março, 1994 - LTr, págs. 48-57.

[5] “Art. 581. (...) § 2º Entende-se por atividade preponderante a que caracterizar a unidade de produto, operação ou objetivo final, para cuja obtenção todas as demais atividades convirjam, exclusivamente, em regime de conexão funcional”.

[6] Seminário Nacional “Advocacia Pública perante os Tribunais Superiores”, realizado no dia 03/12/02.

[7] Rel. Min. Cezar Peluso, DJe nº 176, publicado em 09/09/11.

[8] Os fundamentos nesse sentido expendidos pelos Ministros Marco Aurélio e Cármen Lúcia foram acolhidos pela Corte e assim foram expressos:

“A SRA. MIN. CÁRMEN LÚCIA – Aí, faz referência (o incidente de uniformização de jurisprudência no TST) aos artigos 173 e 195, § 3º, da Constituição, para se afirmar responsabilidade, afirmando-se ali:

‘Registre-se, por lado, que o art. 37, § 6º, da Constituição Federal consagra a responsabilidade objetiva da Administração, sob a modalidade de risco administrativo, estabelecendo, portanto, obrigação de indenizar sempre que cause danos a terceiro’.

Com um detalhe: essa frase é rigorosamente, fragorosamente e exemplarmente contrária à Constituição, porque o artigo 37, § 6º, trata de responsabilidade objetiva patrimonial ou extracontratual. Aqui é responsabilidade contratual, então, na verdade, contrariaram a Constituição” (págs. 40-41) (grifos nossos).

“O SR. MIN. MARCO AURÉLIO – Então, creio que sobra, unicamente, o parágrafo único do artigo 71 da Lei nº 8.666/93, no que exclui – e, a meu ver, ao excluir, não há conflito dessa norma com a Carta a República – a responsabilidade pela inadimplência do contratado, isso quanto ao Poder Público que licita, formaliza o contrato, e o contratado vem a deixar de cumprir com as obrigações trabalhistas, fiscais e comerciais.

A entender-se que o Poder Público responde pelos encargos trabalhistas, numa responsabilidade supletiva – seria supletiva, não seria sequer solidária -, ter-se-á que assentar a mesma coisa quanto às obrigações fiscais e comerciais da empresa que terceiriza os serviços.

Por isso, a meu ver, deu-se alcance ao § 6º do artigo 37 da Constituição Federal que ele não tem, decididamente não tem” (págs. 50-51).

[9] “O SR. MIN. CEZAR PELUSO – A informação prestada pelo Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, invocando inclusive as decisões, é que o Tribunal Superior do Trabalho reconhece a responsabilidade da Administração com base nos fatos, isto é, com base no descumprimento do contrato, e não com base em inconstitucionalidade da lei. Ou seja, o Tribunal Superior do Trabalho não tem dúvida da constitucionalidade da norma, só que reconhece responsabilidade da Administração por questões factuais ligadas a cada contrato em particular. Noutras palavras, eu entendi que, como o Tribunal Superior do Trabalho não tem dúvida sobre a constitucionalidade, seria de todo modo em todo dispensável que o Tribunal a reconhecesse quando não há controvérsia a respeito.

Mas, enfim, se esta Corte entender de conhecer ainda assim quanto ao mérito, não tenho nada que discutir. Considero a norma constitucional também, o que não impedirá que a Justiça do Trabalho continue reconhecendo a responsabilidade da Administração com base nos fatos da cada causa” (pág. 38).

“(...) Eu reconheço a plena constitucionalidade da norma, e se o tribunal a reconhecer, como eventualmente poderá fazê-lo, a mim me parece que o tribunal não pode nesse julgamento impedir que a justiça trabalhista, com base em outras normas, em outros princípios e à luz dos fatos de cada causa, reconheça a responsabilidade da administração” (pág. 40).

“ (...) Só estou advertindo ao Tribunal que isso não impedirá que a Justiça do Trabalho recorra a outros princípios constitucionais e, invocando fatos da causa, reconheça a responsabilidade da Administração, não pela mera inadimplência, mas por outros fatos. Por isso declarei que seria carecedor da ação, porque, a mim me parece reconhecer a constitucionalidade, que nunca foi posta em dúvida, não vai impedir a postura da justiça trabalhista que é agora impugnada, mas é impugnada sob outro ponto de vista. Não é a constitucionalidade dessa norma que vai impedir a Justiça do Trabalho de reconhecer a responsabilidade da Administração perante os fatos!” (págs. 42-43) (grifos nossos).

[10] Assim dispõe o art. 25 da Lei 8.987/95:

“Art. 25. Incumbe à concessionária a execução do serviço concedido, cabendo-lhe responder por todos os prejuízos causados ao poder concedente, aos usuários ou a terceiros, sem que a fiscalização exercida pelo órgão competente exclua ou atenue sua responsabilidade.

§ 1º. Sem prejuízo da responsabilidade a que se refere este artigo, a concessionária poderá contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço concedido, bem como a implementação de projetos associados” (grifos nossos).

[11] Assim dispõem os arts. 60 e 94 da Lei 9.472/97:

“Art. 60. Serviço de telecomunicações é o conjunto de atividades que possibilita a oferta de telecomunicação” (grifos nossos).

“Art. 94. No cumprimento de seus deveres, a concessionária poderá, observadas as condições e limites estabelecidos pela Agência:

[...]

II - contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço, bem como a implementação de projetos associados” (grifos nossos).

[12] “Art. 17. Consideram-se instituições financeiras, para os efeitos da legislação em vigor, as pessoas jurídicas públicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de propriedade de terceiros” (Lei 4.595/64).

[13] “Art. 1º As instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil devem observar as disposições desta resolução como condição para a contratação de correspondentes no País, visando à prestação de serviços, pelo contratado, de atividades de atendimento a clientes e usuários da instituição contratante” (Resolução 3.954/11 do Bacen).

[14] Dados fornecidos pela Divisão de Sistemas Cadastrais (DISIC) do Departamento de Monitoramento do Sistema Financeiro e de Gestão da Informação (DESIG) do Banco Central do Brasil (BACEN).

[15] “Art. 8º O contrato de correspondente pode ter por objeto as seguintes atividades de atendimento, visando ao fornecimento de produtos e serviços de responsabilidade da instituição contratante a seus clientes e usuários:

I – recepção e encaminhamento de propostas de abertura de contas de depósitos à vista, a prazo e de poupança mantidas pela instituição contratante;

II – realização de recebimentos, pagamentos e transferências eletrônicas visando à movimentação de contas de depósitos de titularidade de clientes mantidas pela instituição contratante;

III – recebimentos e pagamentos de qualquer natureza, e outras atividades decorrentes da execução de contratos e convênios de prestação de serviços mantidos pela instituição contratante com terceiros;

IV – execução ativa e passiva de ordens de pagamento cursadas por intermédio da instituição contratante por solicitação de clientes e usuários;

V – recepção e encaminhamento de propostas referentes a operações de crédito e de arrendamento mercantil de concessão da instituição contratante;

VI – recebimentos e pagamentos relacionados a letras de câmbio de aceite da instituição contratante;

VII – execução de serviços de cobrança extrajudicial, relativa a créditos de titularidade da instituição contratante ou de seus clientes; (Revogado pela Resolução BACEN nº 3959 de 2011)

VIII – recepção e encaminhamento de propostas de fornecimento de cartões de crédito de responsabilidade da instituição contratante; e

IX – realização de operações de câmbio de responsabilidade da instituição contratante, observado o disposto no art. 9º.

Parágrafo único. Pode ser incluída no contrato a prestação de serviços complementares de coleta de informações cadastrais e de documentação, bem como controle e processamento de dados” (Resolução 3.954/11 do Bacen).

[16] “Art. 10 O contrato de correspondente deve estabelecer:

I – exigência de que o contratado mantenha relação formalizada mediante vínculo empregatício ou vínculo contratual de outra espécie com as pessoas naturais integrantes da sua equipe, envolvidas no atendimento a clientes e usuários;

II – vedação à utilização, pelo contratado, de instalações cuja configuração arquitetônica, logomarca e placas indicativas sejam similares às adotadas pela instituição contratante em suas agências e postos de atendimento;

III – divulgação ao público, pelo contratado, de sua condição de prestador de serviços à instituição contratante, identificada pelo nome com que é conhecida no mercado, com descrição dos produtos e serviços oferecidos e telefones dos serviços de atendimento e de ouvidoria da instituição contratante, por meio de painel visível mantido nos locais onde seja prestado atendimento aos clientes e usuários, e por outras formas caso necessário para esclarecimento do público;

(...)” (Resolução 3.954/11 do Bacen).

[17] “Art. 3° Celebram contrato de sociedade cooperativa as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro” (Lei 5.764/71).

[18] “Art. 442. Contrato individual da trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego.

Parágrafo único. Qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade cooperativa, não existe vínculo empregatícios entre ela e seus associados, nem entre estes e os tomadores de serviços daquela” (CLT).

[19] Cfr. Ives Gandra Martins Filho e Antonio José de Barros Levenhagen, “90ª Conferência Internacional do Trabalho – Relatório de Participação – Cooperativas de Trabalho” (Revista LTr 66-08/922-930, Agosto de 2002). O dispositivo reza: “8.1) Las políticas nacionales deberían, especialmente: (...) b) velar por que no se puedan crear o utilizar cooperativas para evadir la legislación del trabajo ni ello sirva para establecer relaciones de trabajo encubiertas, y luchar contra las seudo-cooperativas, que violan los derechos de los trabajadores, velando por que la legislación del trabajo se aplique en todas las empresas”.

[20] “7.2) Las cooperativas deben beneficiarse de condiciones conformes con la legislación y la práctica nacionales que no sean menos favorables que las que se concedan a otras formas de empresas y de organización social”.

[21] O termo de conciliação judicial foi firmado em 05/06/03 nos autos do Processo 01082-2002-020-10-00-0, em tramitação perante a 20ª Vara do Trabalho de Brasília-DF, estabelecendo, entre outras condições, as seguintes:

“Cláusula Primeira - A UNIÃO abster-se-á de contratar trabalhadores, por meio de cooperativas de mão-de-obra, para a prestação de serviços ligados às suas atividades-fim ou meio, quando o labor, por sua própria natureza, demandar execução em estado de subordinação, quer em relação ao tomador, ou em relação ao fornecedor dos serviços, constituindo elemento essencial ao desenvolvimento e à prestação dos serviços terceirizados, sendo eles:

a) Serviços de limpeza; b) Serviços de conservação; c) Serviços de segurança, de vigilância e de portaria; d) Serviços de recepção; e) Serviços de copeiragem; f) Serviços de reprografia; g) Serviços de telefonia; h) Serviços de manutenção de prédios, de equipamentos, de veículos e de instalações; i) Serviços de secretariado e secretariado executivo; j) Serviços de auxiliar de escritório; k) Serviços de auxiliar administrativo; l) Serviços de office boy (contínuo); m) Serviços de digitação; n) Serviços de assessoria de imprensa e de relações públicas; o) Serviços de motorista, no caso de os veículos serem fornecidos pelo próprio órgão licitante; p) Serviços de ascensorista; q) Serviços de enfermagem; e r) Serviços de agentes comunitários de saúde.(...)

Cláusula Terceira (...)

Parágrafo Primeiro - É lícita a contratação de genuínas sociedades cooperativas desde que os serviços licitados não estejam incluídos no rol inserido nas alíneas “a” a “r” da Cláusula Primeira e sejam prestados em caráter coletivo e com absoluta autonomia dos cooperados, seja em relação às cooperativas, seja em relação ao tomador dos serviços, devendo ser juntada, na fase de habilitação, listagem contendo o nome de todos os associados. Esclarecem as partes que somente os serviços podem ser terceirizados, restando absolutamente vedado o fornecimento (intermediação de mão-de-obra) de trabalhadores a órgãos públicos por cooperativas de qualquer natureza”.

[22] “Art. 5º. (...) XVIII – a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas de trabalho independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento”.

“Art. 174. (...) § 2º A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo” (grifos nossos).

[23] Cfr. “Introdução à Economia Solidária” (Editora Fundação Perseu Abramo – 2002 – São Paulo).

[24] Seminário sobre “O Cooperativismo e as Novas Relações de Trabalho no Brasil”, realizado em 11/09/09 pela AMATRA e FETRABALHO, no TRT da 4ª Região, em Porto Alegre (RS).

[25] Projeto de Lei 4.622-C de 2004.